Eduardo Ferreira
(ferreiraedu@terra.com.br)

QUADRO DE ANÁLISE DE TIRO DE ARMA CURTA
Wyanet Enterprises – Revista O Tiro DA CBTA - 1977
(Tradução do atirador Paulo Sérgio Carvalhães e Souza)

Este é um artigo muito interessante extraído da revista “O Tiro”, editado pela antiga Confederação Brasileira de Tiro ao Alvo (CBTA), em 1977, e que ainda hoje pode ser útil na aprendizagem dos atiradores iniciantes e juniores sobre fundamentos técnicos, onde o autor apresenta um quadro elucidativo, analisando os diversos tipos de grupamentos, causados por falhas diversas, e a maneira correta de corrigí-las.  

  1. INTRODUÇÃO

O primeiro passo para se obter a melhor precisão no uso de arma curta é entender, antes de mais nada, alguns itens básicos sobre o tiro. Atingir o “x” da zona do10 no seu alvo é tão fácil quanto apontar com o dedo para um relógio de parede. Experimente fazer isso: constatou que é muito fácil. Então, por que razão, num estande de tiro torna-se tão difícil apontar para o alvo? Se você entender a resposta a essa pergunta irá aprimorar a sua técnica e tornar-se um campeão de fato.

Quando você aponta o seu dedo para o relógio, ele não dá recuo e nem fumaça. Portanto aí reside o problema. Qualquer ser humano sofre as influências do estampido e do choque (salto) de um tiro de arma curta. É essa influência que dificulta a sua habilidade em obter a precisão. Antecipar o disparo com o estampido é o principal fator que causa um desempenho negativo no tiro ao alvo.

Você já notou como é que os atiradores veteranos disparam suas armas. Eles atiram naturalmente sem maiores esforços. Desprovidos de receios ou de antecipações do subconsciente, eles já descobriram o segredo. Você também tem que compreender que o estampido e o choque (salto) da arma são os fatores que tornam o tiro ao alvo um dos esportes mais antigos e de maior difusão no mundo inteiro.

  1. COMO FUNCIONA O QUADRO DE ANÁLISE

Tanto os instrutores de tiro como os próprios atiradores experientes já descobriram que uma série de tiro falhos, numa determinada área do alvo, indicam a existência de um erro definido e específico por parte de um atirador. A causa do erro será indicada exatamente pelo setor do alvo atingido por esses disparos fora do centro, denominados “tiros escapados”.

Todos os tiros disparados sobre o seu alvo de ensaio atingirão algum dos oito setores no quadro de análise. A simples leitura desse quadro lhe informará o que você fez para que o seu tiro atingisse aquele setor. É quase impossível tentar analisar os seus tiros ao mesmo tempo em que você dispara. O “choque” da arma tende a bloquear sua visão, impedindo-o de verificar o que aconteceu imediatamente antes de disparar. Evidentemente, para utilizar corretamente o seu quadro de análise, temos de presumir que a sua arma está com a mira devidamente regulada para o centro do dez.

  1. A LEITURA DO SEU QUADRO DE ANÁLISE

O seu quadro está provido de abreviaturas codificadas, que lhe ajudarão a interpretá-lo sem maiores problemas. Agora vamos examinar a sua divisão em setores, para descobrir qual o erro do seu disparo, quando os seus tiros se agrupam repetidamente em um determinado setor do alvo. Caso você seja canhoto, devem-se inverter todas as posições.

a. Espalmar - (ESP)

Os tiros que atingem a parte superior direita do seu alvo, entre 01:00 e 02:00hs, do quadro de análise, mostra que você está “espalmando” a arma. Esse tipo de antecipação demonstra que o atirador está empunhando a arma com força demasiada durante o momento do disparo em que aperta o cabo da arma para dentro da palma da mão. Isso causa a elevação da massa de mira para cima e para direita.

ESP

Esse erro comum pode ser corrigido simplesmente se você mantiver uma pressão constante ao empunhar a sua arma durante toda a seqüência do seu disparo. Você não pode modificar alternadamente a pressão de sua empunhadura enquanto aguarda ansiosamente o comando de disparo. Concentre-se no alinhamento das miras e mantenha uma pressão igual e firme na empunhadura até depois de ter efetuado o disparo. Um bom acompanhamento (follow trough) é muito importante, se quiser evitar que os seus tiros continuem atingindo esse setor do alvo.  

b. Inclinação da arma (INC)

Muitos atiradores nunca repararam no fato de que estão inclinando a arma para o lado direito enquanto alinham as miras. Isso é geralmente causado pela pressão do polegar sobre o lado direito da arma. Quando ocorre o disparo, essa pressão fará com que o tiro “caia” para o lado direito do alvo, ou seja, no setor das 02:00 às 04:00hs do quadro de análise.

O seu polegar oferece um grande auxílio na correção do alinhamento das miras. Deverá exercer a mesma pressão sobre o lado esquerdo da arma que a base do dedo indicador exerce sobre o lado direito. Todas as forças empregadas devem ser equivalentes. Uma empunhada incorreta causará disparos desiguais.

INC

Lembre-se de que a única parte da sua mão que deverá se mover durante toda a ação do disparo é o dedo do gatilho. Qualquer outro movimento provocará um tiro incorreto.

c. Estrangulamento

A maioria dos atiradores iniciantes comete o erro de empunhar a arma com excesso de força. Um atirador que empunha a arma com força de um “torno de bancada” encontrará seus tiros todos agrupados no setor entre as 04:00 e 05:00hs. À medida que o disparo é efetuado com uma empunhadura “estrangulada”, o cano tenderá a desviar-se para baixo e para direita.

EST

A solução para esse problema da empunhadura “estrangulada” é muito fácil se você compreender que empunhar uma arma com demasiada força é totalmente desnecessário para se obter um bom tiro. A arma deve “repousar” confortavelmente em sua mão. Exerça apenas a pressão de empunhadura suficiente para lhe assegurar o controle da mesma. Retesar os músculos excessivamente, transformando a sua mão num “torno” causará o cansaço prematuro, além de outros fatores que prejudicam a precisão. Uma empunhadura firme, com a ajuda de todos os dedos, lhe ajudará a obter ótimos resultados. Igualdade de empunhadura e consistência durante toda a seqüência do disparo eliminarão a ausência de precisão causada pela empunhadura errada.

d. Torção do pulso

Aqui temos outro exemplo de um problema causado pelo receio do recuo. O atirador descobre que muitos de seus tiros se concentram no setor das 05:00 às 07:00 hs de seu quadro. Provavelmente está inclinando a arma para baixo ou torcendo o pulso no momento do disparo. Isso é causado pela antecipação do recuo. Em outras palavras, o atirador tenta conter o recuo ou tenta diminuir ou compensar o recuo da arma, inclinando-a para baixo.

TOR

Neste caso, a chave do problema é obter um “follow trough” correto. Acompanhar o tiro (follow trough) não se restringe a manter corretamente a empunhadura, acionamento do gatilho e o enquadramento do alvo durante o disparo, e sim que todos esses fundamentos têm que ser controlados mesmo depois que o disparo tenha sido efetuado e que a arma já deu o “salto”. O salto é a última experiência na emoção de um disparo... devemos apreciá-lo com prazer.

e. Gatilhada

O ato de acionar o gatilho para trás de uma forma rápida demais, é um erro chamado de “gatilhada” e fará com que os tiros atinjam a parte inferior esquerda do alvo. Quando aparecem muitos tiros neste setor você pode ter certeza que você puxou o gatilho para trás muito depressa, de uma forma brusca, para apressar o disparo.

GAT

Quando se consegue um correto alinhamento das miras, isso não é um sinal de que seu dedo deva acionar o seu gatilho imediatamente, antes que aconteça algo. Quando as miras estão alinhadas, seu cérebro deverá comandar para o dedo indicador uma pressão constante e uniforme sobre o gatilho. A maior parte da sua concentração deverá estar focada no aparelho de pontaria: além disso, o acionamento do gatilho é o segundo aspecto mais importante no disparo da arma. Atirar “em seco” poderá lhe dar uma grande ajuda. Você poderá eliminar o estampido e o salto, concentrando-se totalmente num acionamento de gatilho lento e constante.

f. Dedo do gatilho

Os atiradores demonstram uma tendência a subestimar a importância da correta colocação do dedo sobre a tecla do gatilho. A maioria dos atiradores introduz demasiadamente o dedo do gatilho (indicador) no “guarda mato” da arma. Isso faz com que os tiros atinjam a parte esquerda do alvo, ou seja, o setor das 08:00 às 10:00hs do quadro.

DED

O meio da falangeta deverá repousar sobre o centro da tecla do gatilho. Se, ao início, isso lhe parecer desconfortável, essa sensação logo irá desaparecer quando você verificar a melhoria rápida de seus resultados. Outro fator muito importante a respeito do acionamento do gatilho é o seguinte: ele deverá ser puxado diretamente para trás e no prolongamento do seu antebraço. Se qualquer pressão for aplicada lateralmente, por menor que seja, os tiros voltarão a atingir o setor das 08:00 às 10:00hs.

g. Antecipação do recuo

Um atirador que, ao mesmo tempo, aciona o gatilho e aguarda o “salto”, invariavelmente acabará por se antecipar ao salto. Isso acontece ao se erguer o cano da arma antes de ocorrer o disparo. O atirador que demonstra “ajudar” a arma no seu salto verificará que seus tiros irão atingir a parte superior esquerda do alvo, ou seja, o setor das 10:00 às 11:00hs do seu quadro.

ANT

Para corrigir esse problema carregue sua arma deixando algumas câmaras vazias. Dispare a arma sem saber quais as câmaras que estão com cartuchos. Você se surpreenderá ao perceber que está se antecipando ao salto, quando disparar sobre uma câmara vazia e constatará a mira subindo para a esquerda. A chave está no correto follow trough observado. Efetue o disparo sem perturbar nenhum dos fundamentos de precisão. Esqueça-se do “salto”. Acione o gatilho para trás lentamente e deixe que o disparo lhe surpreenda. Se você estiver ciente do exato momento em que a arma for disparar estará se antecipando ao “salto”.

h. Sobressalto

O sobressalto é o sintoma menos compreendido pelo atirador iniciante. Algumas pessoas sem muito controle emocional tremem na ocasião do disparo. Outros atiradores tremem apenas com a cabeça, mão ou piscam os olhos. Geralmente um disparo acompanhado do sobressalto jogará o tiro na parte superior do alvo, ou seja, no setor das 11:00 às 01:00hs do quadro.

SOB

O sobressalto é uma tendência nervosa de antecipação, que ocorre quando você aciona o gatilho e o seu corpo ainda não está preparado para tal. Mais uma vez, carregando alternadamente as câmaras de sua arma ou colocando estojos deflagrados em seu carregador, será mais fácil observar o que está ocorrendo. Quando você realmente puder visualizar o seu sobressalto estará começando a controlá-lo.

Verifique a posição do cano quando escutar o estalido de um disparo inesperado sobre uma câmara vazio. Vai ver e sentir todo o seu corpo reagir ao que você pensava que iria acontecer se tivesse realmente ocorrido um disparo. Antes de atirar, tome um gole d’água ou leia algo. Experimente chegar cedo ao estande de tiro ... fique tranqüilo. A ansiedade é o seu maior concorrente. O tiro ao Alvo é um esporte de precisão e de controle muscular. Os seus músculos não lhe permitirão um tiro preciso se estiverem todos tensos ou cansados.

Agora que você conhece o significado de cada setor do seu quadro, já está em condições de passar à prática. Leve o quadro de análise para o estande de tiro. Talvez prefira cola-lo ao lado da sua maleta de tiro onde transporta a sua arma. Examine-o e estude-o antes de iniciar o treinamento. Basta o simples conhecimento do significado do quadro para que você possa aprimorar a sua perícia no Tiro.

Comece a efetuar séries de cinco disparos sobre o seu alvo. Compare os resultados com o quadro de análise. Veja quais são os seus erros e efetue as correções necessárias. Se os seus tiros estão espalhados sobre toda a superfície do alvo é sinal de que você precisa de maior treino, até que obtenha um grupamento mais fechado. Quando conseguir isso, desloque esse agrupamento para dentro da parte preta do alvo, consultando o quadro de análise e concentrando-se naquilo que não deve fazer. Seguindo passo-a-passo as instruções acima, corrigindo individualmente cada segmento do quadro, você estará em condições de disparar com a mesma facilidade com que aponta o seu dedo para um relógio de parede.   


por Eduardo Ferreira
Recordista e campeão brasileiro de armas longas da CBTE e das Forças Armadas. Ex vice-presidente da CBTE e da federação do DF, ex presidente das federações do RJ e CE, e diretor das federações da PB e RS. Autor de "Arma Longa" e "História do Tiro"
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