Confederação
do Tiro Brasileiro
1.
Implantação e crescimento da Confederação
Como
havíamos comentado no artigo anterior, a Confederação
do Tiro Brasileiro prestou um relevante papel ao tiro brasileiro,
tornando-se a entidade responsável pela implantação
e divulgação do esporte no País, no início
do século XIX.
Além
de congregar sociedades de tiro dos Estados de S. Paulo, Rio Grande
do Sul, Rio de Janeiro e Pará, a Confederação
deu início a um processo de ampliação dessas
entidades por intermédio de seu primeiro presidente –
Dr. Elysio de Araújo – criando novas sociedades de
tiro no interior paulista, no Paraná e Amazonas.
A
transferência da sede para o Rio de Janeiro, por determinação
do Ministro da Guerra – Marechal Hermes da Fonseca foi muito
importante, pois assegurou prestígio e toda infra-estrutura
necessária.
Convém
lembrar que nessa época não existia qualquer entidade
civil encarregada de apoiar e desenvolver os esportes amadores,
particularmente o tiro. Além disso, vários educadores,
seguindo o modelo europeu, não viam com bons olhos jovens
praticando esportes, onde os atletas eram tratados com desdém
e com insignificância pela sociedade brasileira.
Graças
ao Decreto No. 2067, de 07 de janeiro de 1909, o Exército
Brasileiro regulamentou a filiação dos “atiradores”
à Confederação, bem como a cessão
das linhas de tiro e estandes para as provas constantes dos calendários
das sociedades. Foi ainda normatizado o uso do armamento, do velho
e conhecido fuzil Mauser, da munição e do pessoal
de apoio. O tiro viveu um período de crescimento e de prosperidade.
No
entanto, este rápido crescimento provocou ciúmes
e divergências entre algumas autoridades militares, culminando
com o desfile de 4.000 “atiradores”, na parada cívica
de 15 de novembro, promovida pela Confederação no
Rio de Janeiro.
O
artigo publicado no jornal paulista “Sport”, pelo
entusiasmado desportista Luiz da Fonseca, revela com muita propriedade
os revezes sofrido pela entidade naquela época: “Satisfazendo
a reiterados pedidos de diversas sociedades e desejando mesmo
demonstrar publicamente o progresso em que se achava, a Confederação
organizou uma grande parada das Linhas de Tiro na Capital da República,
em 15 de novembro de 1909.
Quatro
mil e tantos atiradores, formados em companhias, corretamente
fardados, precedidos de bandas de música próprias
e bandas de tambores e cornetas, marchando garbosamente, desfilaram
pelas grandes avenidas do Rio de Janeiro sob aclamações
do povo.
Foi
uma “revelação: a Confederação
do Tiro era uma realidade, era uma força”.
Continua
o artigo: “Nessa ocasião começou-se a verificar
que algumas autoridades militares do exército eram hostis
à Confederação e isso em contraste com a
boa vontade, carinho mesmo, com que capitães e tenentes
instruíram esses quatro mil homens, pois cada sociedade
confederada vivia sob a fiscalização de um oficial
do exército, em regra um tenente, que também era
instrutor dessas companhias.”
Nem
mesmo o fato do Marechal Hermes da Fonseca, reorganizador da Confederação
e seu maior protetor ter assumido a Presidência da República,
trouxe esperanças de melhores dias para a Confederação.
Devido ao período político conturbado o marechal
não teve condições de ajudar a entidade.
O
receio dos militares e políticos de assistirem aqueles
homens armados com fuzil, espalhados pelo Brasil praticando tiro,
fez com que a Confederação passasse a ser olhada
com restrições e desconfiança.
2. Declínio da CTB
Desconsolado
e sem apoio do Ministério da Guerra, o Dr. Elysio de Araújo
demitiu-se do cargo em 1911, sendo substituído pelo General
Cruz Brilhante que tentou erguer a Confederação
sem sucesso. É interessante a comparação
que Luiz da Fonseca faz com a Argentina, que também possuía
o mesmo tipo de serviço militar, inspirado no modelo suíço:
“Todavia, o que é mais edificante e o que mais compunge
a alma dos patriotas, é que esse hercúleo esforço
que todos fizeram pela vida e prosperidade do tiro no Brasil,
esforço que se perdeu, foi frutificar na República
da Argentina.
Alarmados
com o progresso da instituição do tiro, nos seus
tempos áureos, os argentinos vieram conhecê-lo de
visu e logo transplantaram para o seu país, onde hoje é
uma instituição nacional, muito próspera
e protegida pelos poderes públicos e pela população.”
3. Campeonato Pan-Americano de Buenos Aires
Muito
embora os nossos atiradores atuais acreditem que a primeira participação
internacional da equipe brasileira tenha sido na Antuérpia,
a nossa estréia em eventos internacionais se deu realmente
em 1910, em Buenos Aires, no Campeonato Pan-Americano promovido
pelo Tiro Federal Argentino.
Sobre
esse campeonato, Luiz da Fonseca criticou o nosso desempenho e
a situação da Confederação: “Ainda
ultimamente, em um grande concurso de tiro, na Argentina, em que
figuraram todas as nações da América do Sul
e também os Estados Unidos, a República da Argentina
conquistou o segundo lugar, cabendo o primeiro aos Estados unidos.
Ao Brasil coube o penúltimo lugar”
“Se tais fatos nos servissem de lição, era
o caso de nos alegrarmos, infelizmente, tal não tem sucedido
e não sucederá, pois é com indiferença
quase geral que tudo isso sucedeu”
Cabe
uma pequena reflexão sobre a nossa fraca participação
na Argentina. Deste evento conhecemos muito pouco, quase nada
foi escrito sobre a equipe brasileira e seus resultados. Somente
recentemente tivemos conhecimento deste fato histórico
para o Tiro Brasileiro, através de documentos guardados
cuidadosamente pelo Tiro Federal Argentino. Para aqueles que visitarem
a galeria do estande do Tiro Federal, verão um quadro comemorativo,
em destaque, com referências ao evento realizado.
4. Conclusões
Apesar
dessas severas críticas e acusações, os Tiros
de Guerra revelaram-se de grande importância para o desenvolvimento
do Tiro no Brasil, permitindo que civis e militares, lado a lado,
pudessem praticar o esporte em suas linhas, contribuindo para
o aprimoramento técnico dos atiradores e possibilitando
a organização das primeiras provas nacionais.
Em
todo período de sua existência, a Confederação
do Tiro brasileiro reuniu cerca de 127 sociedades e mais de 20.000
“atiradores”confederados, prestando inestimáveis
serviços à Pátria. Só no Rio Grande
do Sul foram construídas 18 linhas pelo Exército
e 110 pelas sociedades de tiro de origem germânica.
Com
o advento da Primeira Guerra Mundial em 1914, as sociedades de
tiro sofreram profundas mudanças. Houve o fechamento e
o recolhimento do armamento e munição de algumas
sociedades, particularmente, as de origem alemã.
Em
1917, foi criada a Direção Geral dos Tiros de Guerra
em substituição à Confederação,
mantendo praticamente a mesma estrutura da anterior e permanecendo
diretamente ligada ao Ministério da Guerra.
Remanescente
daquele tempo e em plena atividade nos dias atuais, encontra-se
o Centro Cultural e Desportivo Tiro 4, originário do clube
Tiro 4, fundado em 24 de fevereiro de 1906, pelo Coronel Germano
Steigleder.
Faço
aqui, um apelo aos nossos leitores no sentido de pesquisar e levantar
os nomes dos nossos atiradores que participaram do campeonato
Pan-Americano em Buenos Aires para preservação da
nossa História.
por Eduardo Ferreira
Recordista e campeão brasileiro de armas longas da CBTE
e das Forças Armadas. Ex vice-presidente da CBTE e da federação
do DF, ex presidente das federações do RJ e CE,
e diretor das federações da PB e RS. Autor de "Arma
Longa" e "História do Tiro"
ferreiraedu@terra.com.br